domingo, 6 de fevereiro de 2011

Creative Commons

Esse assunto tem dado o que falar por ai.
Repasso essa matéria para vocês entenderem mais.

O Creative Commons é um projeto de licenciamento baseado integralmente na legislação vigente sobre os direitos autorais. As licenças do Creative Commons permitem que criadores intelectuais possam gerenciar diretamente os seus direitos, autorizando à coletividade alguns usos sobre sua criação e vedando outros. Ele é um projeto voluntário: cabe a cada autor decidir por seu uso e qual licença adotar. Existem várias modalidades de licenciamento, desde mais restritas até mais amplas. A licença mais utilizada do Creative Commons não permite o uso comercial da obra. A obra pode circular legalmente, mas quando utilizada com fins comerciais (por exemplo, quando toca no rádio ou na televisão comerciais), os direitos autorais devem ser normalmente recolhidos. Essa licença possibilita a ampla divulgação da obra, mas mantém o controle sobre sua exploração comercial.

O projeto tem sido criticado recentemente por representantes das sociedades que fazem a arrecadação e distribuição de direitos autorais, como a UBC (União Brasileira dos Compositores) ou o Ecad. Tais críticas são compreensíveis. Essas sociedades vivem há muito tempo uma crise de legitimidade de duas naturezas: interna e externa. Interna porque precisam conviver com a insatisfação permanente de seus próprios membros. Apesar do aumento significativo da arrecadação do Ecad (de 112 milhões em 2000 para 260 milhões de reais em 2006), esses recursos ainda não chegam adequadamente à maioria dos autores. Quando chegam, isso ocorre após a dedução de taxas de administração que não são estabelecidas pelo mercado, mas arbitradas, já que o Ecad detém o monopólio sobre sua função.

A segunda crise de legitimidade é externa. Com o surgimento da cultura digital, o número de pessoas que passaram a criar obras intelectuais multiplicou-se enormemente. Enquanto isso, todas as sociedades arrecadadoras do mundo, quando reunidas, representam menos de 3 milhões de autores. É muito pouco. Esse baixo número de representados contrasta com o crescente número de novos criadores na era digital, ansiosos por modelos inovadores de gestão e exploração das suas obras.

O Creative Commons ajuda a atender parte desses anseios e por isso é criticado. Já as sociedades arrecadadoras, por sua vez, permanecem com um grave dilema institucional. Ao verificar o estatuto do Ecad, por exemplo, nota-se que o poder de voto dentro da instituição é dado de acordo com o volume de recursos arrecadados por suas sociedades-membro no ano imediatamente anterior. Ou seja, quem arrecada mais dinheiro tem mais voto. É uma representatividade não de pessoas, mas de poder econômico (em vez de democracia, plutocracia). Isso praticamente inviabiliza o surgimento de novas associações de autores. Especialmente associações que reúnam a nova geração de músicos, por natureza arredios à ineficiência, à burocracia e à ausência de transparência.

Quando um artista licencia sua obra através do Creative Commons, ele não abdica de maneira alguma dos direitos sobre ela. Ele permanece a todo momento como dono da totalidade dos direitos sobre a sua criação. Essa situação é diferente, por exemplo, do modelo em que criadores intelectuais transferem a totalidade dos seus direitos para um intermediário. Nessa situação, sim, o criador deixa de ser o dono de sua obra. A partir desse momento, nada mais pode fazer com ela. É inegável que autores e criadores têm o direito de optar sobre como explorar sua obra. Mas é claramente do seu interesse poder conjugar a manutenção dos seus direitos com a distribuição e exploração de suas obras. Quando um grupo musical como o Mombojó licencia suas músicas através do Creative Commons, isso não impede — se o grupo assim desejar — o lançamento de disco com essas músicas por uma gravadora. Ao contrário, maximiza o alcance da sua criação, legalmente, enquanto preserva o controle sobre sua exploração econômica.

Esse é apenas um dos caminhos que os criadores da nova geração estão interessados em trilhar. O desafio é inventar novos modelos, gerando formas de sustentabilidade econômica mais eficientes e democráticas para a criação intelectual, mais adequados à nova realidade digital. Trata-se de um desafio para toda a sociedade.O Ministério da Cultura tem sido elogiado no Brasil e no mundo por ter abraçado essa discussão, incentivando a busca de soluções criativas para seus impasses. Por causa desse pioneirismo, o ministro Gilberto Gil realizou o discurso de abertura da assembléia geral da Organização Mundial da Propriedade Intelectual em Genebra no ano passado, convite raro para autoridades brasileiras.

O Creative Commons responde apenas por permitir algumas possibilidades de experimentação, que já foram adotadas por muitos artistas zelosos de seus direitos. Apesar de voluntário, hoje existem cerca de 150 milhões do obras licenciadas através do projeto. Ao mesmo tempo, seu escopo vai muito além das obras musicais. Um dos seus aspectos mais importantes é o chamado Science Commons, que fortalece e amplia a disseminação do conhecimento científico. Assim, o Creative Commons demonstra que, nesta época de grande autonomia gerada pela tecnologia digital, é possível que o direito autoral seja exercido diretamente, e com grande facilidade e praticidade, pelos autores e criadores, e não apenas através de intermediários.

Artigo publicado no jornal O Globo no dia 28 de setembro de 2007, com o título Solução Criativa.

O site do Minc retirou o logo do Creative Commons. E daí?

Andei lendo que o Ministério da Cultura (MinC) retirou de seu site o logo do Creative Commons. Como era esperado, logo começou a reação.

Matéria publicada n’O GLOBO deu conta de uma certa “chiadeira nas redes sociais” e trouxe a opinião do vice-coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV, Carlos Affonso, para quem retirar a menção à licença e simplesmente dizer que o conteúdo do site pode ser copiado, desde que o crédito seja dado, cria um “problema jurídico” pela falta de transparência, que pode afetar a imagem do Brasil lá fora.

Discordo. O Ministério da Cultura apenas não usa mais uma licença específica com a grife “Creative Commons” em seu site. Substituiu a frase "O conteúdo deste sítio é publicado sob uma Licença Creative Commons", pela frase: "Licença de Uso: O conteúdo deste site, produzido pelo Ministério da Cultura, pode ser reproduzido, desde que citada a fonte".

O próprio Ministério salientou que “a retirada da referência ao Creative Commons da página principal do Ministério da Cultura se deu porque a legislação brasileira permite a liberação de conteúdo. Não há necessidade de o ministério dar destaque a uma iniciativa específica. Isso não impede que o Creative Commons ou outras formas de licenciamento sejam utilizados pelos interessados". Perfeito.

Então qual é o problema? Qual a razão da chiadeira? O Creative Commons tem a pretensão de ser uma nova plataforma – e pelo barulho que faz, parece que pretende ser a única. A alteração do texto inserido no site do Ministério é juridicamente válida e basta para que qualquer um reproduza o conteúdo livremente, desde que citada a fonte, sem qualquer necessidade de uma licença específica como é o caso da grife CC.

Ronaldo Lemos, Diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas e Diretor do Creative Commons no Brasil, chegou a afirmar que "do ponto de vista jurídico, a frase que colocaram lá não quer dizer nada. Quem utilizar os conteúdos do site com base nela enfrenta um problema de insegurança jurídica enorme". Peraí: Do ponto de vista jurídico a frase quer dizer literalmente o que menciona. Que insegurança ela gera? O conteúdo está liberado, basta citar a fonte. Existe maior liberdade do que essa? Segundo ele sim. “Os direitos do CC são muito mais amplos e melhor formulados, abrangendo a produção colaborativa, o desenvolvimento de obras derivadas, a disseminação e assim por diante. Dessa forma, o site do MinC perdeu muito com a mudança". Que propaganda explícita do produto, hein?

Qual nada. Quem pensa em reutilizar, recombinar ou remixar os textos do Ministério da Cultura para criar obras derivadas? A disseminação está garantida. O que o Creative Commons pretende é ser reconhecido como a única e a mais perfeita licença disponível, como se fosse o mais perfeito e acabado contrato de adesão, pelo qual todos devem se pautar na área cultural. O que deixou o Creative Commons contrariado foi a retirada da propaganda gratuita que a chancela governamental trazia. Insistem que o Minc perdeu muito com a mudança, mas quem verdadeiramente perdeu foi a própria grife CC.

Ninguém se pergunta o que há por trás do Creative Commons. Quais os interesses envolvidos? Quem financia esses interesses? É muito fácil falar que a lei brasileira é restritiva e que é preciso dar mais liberdade para a cultura digital, difícil mesmo é proteger o direito do autor. O Creative Commons é uma excelente ferramenta de marketing, que atrai muitos simpatizantes entre artistas que ainda não alcançaram o sucesso - e por isso mesmo não têm nada a perder - ou que já alcançaram tanto que podem se dar ao luxo de abrir mão de uma parte de sua obra. Na verdade, abrem mão de uma parte e ganham em troca a simpatia dos fãs e uma aura de “democratas da cultura”, que certamente implica em maior retorno de marketing, propaganda, visibilidade e ... lucros! São iniciativas pontuais, cuidadosamente planejadas. Artistas consagrados não abre mão de tudo, evidentemente, e nunca aderem inteiramente ao Creative Commons. No fundo, estamos falando de negócios, de dinheiro, e não de democratização da cultura.

De Globo.com por Renato Pacca.

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